quarta-feira, 11 de maio de 2011

FIGUEIREDO ERA UM BURRO!

Através do nosso Blog (http://cronicasdojair.blogspot.com/), espaço organizado de forma hábil, profissional e talentosa pelo Mago da editoração eletrônica Claudio Cunha, um leitor, aliás, convido você a visitar este Blog e verificar os conteúdos e opinar, interagir junto ao mesmo. Pois um leitor perguntou se Morungava existia, se era Vila e onde ficava. Por favor, quem não conhece Morungava não conhece o Rio Grande. Tenho saudades deste recanto bucólico a paradisíaco. Não vou a Morungava como deveria e como gostaria, mas meu projeto é retornar em definitivo ao solo morungavense para o descanso final, ou seja, no dia em que “bater a caçuleta”, “bater as botas”, “morar na cidade dos pés juntos”, mas isto acredito que deva ser daqui uns 65 anos, mais ou menos. Pretendo ficar ali na cerca do cemitério, na beira da estrada, próximo daquela frondosa figueira. No meu túmulo não quero flores de plástico. Por favor, exagerem nas flores naturais até para atrair os passarinhos e o fundamental, na lápide a seguinte inscrição: “Aqui neste local muito contra vontade, um jornalista e contador de causos". Mas vamos ao que interessa, lá pelos anos 70 visitávamos muito o sitio do tio Dino, onde nos deliciávamos com as broas de milho quente com nata feitas pela tia Miúda, além das carnes de panela, pirão com farinha de mandioca com pedaços de costelas bovinas. Outra especialidade da tia Miúda eram os apetitosos “bijus”, que delícia. Muitas vezes ficávamos as férias inteiras no sitio. Tomávamos banho pelados na lagoa, a noite ficávamos pescando contemplando as estrelas, bem como descíamos de carro de lomba colina abaixo, e muitas vezes derrubávamos as lixiguanas dos canto da casa, ou como dizia Rubão do Rio Branco “as bichiguanas”, com uma taquara com um pano na ponta ensopado de querosene e que o negro Jesuino ajudante do meu tio teimava em dizer “Corosena”. Tio Dino tinha um burro chamado “Figueiredo”, nada a ver com o “ex-presidente ditador”, que por sinal afirmou que gostava mais de cavalos do que de gente! Ninguém sabe a origem do nome do burro, pois meu tio comprou o mesmo de um colono lá do “Cantão dos Guilhermes” em Santo Antônio da Patrulha e o bicho já tinha sido batizado de Figueiredo. Só que com o passar dos tempos o burro foi ficando velho, cansado e doente. Para trazer o Figueiredo até o pátio do sítio precisava de três pessoas, um para puxar e dois para empurrar. Naquela época aparecia muito por aquelas paragens os carreteiros vindos de Santo Antônio da Patrulha trazendo ovos, melado, rapaduras, galinhas, porcos, milho, feijão, tamancos e outros produtos. Não raro pernoitavam no sítio do tio Dino, onde se instalavam no galpão e seguiam para Taquara ou Gravataí na manhã seguinte. Também andavam por Morungava os “mascates” que vendiam espelhos, perfumes, loção de Lancaster, brilhantina, xampu (aqueles em pequenos saquinhos tipo mel, lembra?), sombrinhas, roupas, cuecas, calcinhas, fontol, lacto purga, olina (e até pôster do colorado) e outras muambas. Quem também aparecia por lá eram os ciganos vendendo panelas que não podiam ser ariadas com esfregão de aço, pois furavam, cobertores e não obstante tentavam ler a “suerte” de algum incauto de mão aberta. Um dia estávamos sentados na frente da casa e avistamos um grupo de ciganos lá na estrada do Passo da Caveira, isto distante uns dois quilômetros e aí tio Dino observou: “Hoje nós vamos vender o burro Figueiredo para os ciganos, mas preciso da ajuda de vocês gurizada” afirmou olhando para mim e para os primos. “Quando eu falar em vender o burro vocês começam a chorar”. A ciganada chegou numa caminhonete veraneio cinza escoltada pelo Peri e a guaipecada toda. O cigano velho sorriu mostrando quatro dentes de ouro e tentou fazer negócio. Depois de comprar um cobertor e duas panelas, tio Dino propôs a venda do Figueiredo.  Ofereceu o burro Figueiredo por  mil e duzentos cruzeiros (no dinheiro de hoje como diz o Paulo Pança, equivaleria a uns R$ 800,00). O cigano ofereceu 600 mil cruzeiros em dinheiro e o restante em panelas, cobertores, chaleiras, fronhas e lençóis. Tio Dino valorizou o negócio e afirmou: “Olha vou me desfazer do Figueiredo pela necessidade, porque o bicho além de bom no serviço é como se fosse da família”, falou com a voz embargada. E nisto chamou a gente: “Gurizada vão até o galpão e tragam o Figueiredo”  Trouxemos o burro e aí começamos o teatro. A gente desandou a chorar e este escriba disse: “Tio não venda o Figueiredo, onde é que vamos arrumar um animal que trabalhe tanto como ele e seja tão bonzinho?”. Meus primos chegaram exagerar e rolavam no chão de tanto chorar. Duas horas depois os ciganos seguiram estrada a fora levando o Figueiredo na veraneio. Duas semanas depois a gente estava carregando uma carreta de pasto e avistamos o grupo de ciganos vindo em direção ao sitio. Corremos para avisar tio Dino que já esperou os ciganos com a “Isolina” na mão. A Isolina era uma espingarda herdada do pai da tia Miúda e havia participado da revolução de 23 e segundo tio Dino, a Isolina tinha arriado muitos gaudérios de lenço branco nesta escaramuça. Quando o cigano dos dentes de ouro chegou à frente da porta da casa, tio Dino saltou para fora com cara mais brava que nenê cagado e foi logo dizendo: “Olha cigano aqui no Morungava  não se desfaz negócio. Não devolvo o dinheiro nem a mercadoria”. O cigano de forma calma e com medo logo observou: “Olha eu não vim desfazer o negócio com o senhor, só queria que me alugasse as crianças por uma tarde, para chorarem lá na cidade, para ver se eu encontrou um bobalhão que nem eu para comprar este burro”. É claro que tio Dino não permitiu e botou os ciganos a correr campo fora.  No centro de Morungava os ciganos num ato de protesto abandonaram o Figueiredo na frente da Prefeitura. O bicho chorava dia e noite próximo ao centro administrativo. Cansado o prefeito mandou colocar o burro dentro de um caminhão e pessoalmente se deslocou junto com o motorista e devolveu o Figueiredo ao tio Dino, destacando: “Trouxe o burro de volta para o senhor seu Dino porque o burro grita tanto na frente da Prefeitura que está atrapalhando os lá de dentro de trabalhar”.
Um forte abraço aos amigos da Loja 15 da Ortobom que são assíduos leitores de nossas crônicas. Sucesso para vocês e muitas vendas.

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