quinta-feira, 28 de agosto de 2014

TIO DINO E O CEMITÉRIO

Bar de frente pro futuro ficava na beira da estrada bem na frente do cemitério de Morungava
Se tem um ponto turístico em Morungava além é obvio das cascatas, matas preservadas, sítios de lazer e o Morro do Itacolomi  é o cemitério. Nos dias de finados é uma “festa” de tanta gente viva em romaria para acender velas e levar flores aos seus mortos, aliás, os mortos de Morungava a maioria tem mais de 80 anos. Lá ninguém morre jovem, de ataque cardíaco, derrame e outras doenças do mundo consumista. Depressão? Só a de 1929 que quebrou os Estados Unidos. Estresse? Para que estresse se a vida é bela. Em Morungava ninguém sofre por antecipação e após o almoço a ciesta é certa e reparadora. Nos finados, barracas comercializando flores, ambulantes vendendo pasteis, água mineral e outros produtos que ajudam no aumento do colesterol, triglicerídeos e outras doenças modernas. Bem na frente no cemitério tio Dino era proprietário de um bar que tinha um nome sugestivo especialmente aos pinguços “Bar de frente pro futuro” que apontava justamente para o “campo santo”, última morada, lugar dos pés juntos, lugar onde o pobre e o rico fedem iguais, às vezes o rico fede mais ainda. Esta semana o velho Dino me ligou e quando ele telefona quase sempre é indignado. Desta feita sua indignação é com relação ao chamado banho de gelo que os ricos e famosos estão fazendo. Ele já chega atravessando, cuspindo marimbondo, soltando fogo pelas ventas “Tu já viu este negócio que a burguesada está fazendo? Este troço de banho de gelo, isso é viadagem de quem não tem o que fazer. Vão carpir uma roça, ou pintar uma creche ou uma escola. Vão cantar num asilo, vão visitar as crianças com câncer nos hospitais de Porto Alegre. O pior é que esta bosta começou lá na terra do tio Sam e o brasileiro que gosta de imitar já está aderindo e depois ficam bravos que o Maradona nos chama de macacos” alerta tio Dino. Mas depois mais calmo ele contou  uma história pitoresca ocorrida nos tempos do “Bar de frente pro futuro” Lá no Morungava nos anos 70 apareceu um teatino que alguns acreditavam  ter se refugiado na cidade em função da ditadura, outros pensavam que podia ser um espião do “Dops”. Na verdade Feliciano se arranjava trabalhando em sítios e pequenas propriedades de Morungava, ajudando na roça e no campo na lida com o gado. Final de tarde chegava ao bar onde cumpria um ritual, pedia um martelo (copo) com cachaça do Monjolo produzida pelo Antônio Selistre “Toninho Gordão”, pai do Vicente Selistre, com biter. Feliciano na frente do bar e sob o olhar contrariado dos clientes erguia o copo e olhando para o cemitério dizia: “E ai defuntaiada vai um gole aí?” Isso acontecia de segunda a sexta-feira e tio Dino sempre respeitador ficava bravo com a postura do teatino Feliciano do “Dops ou do MR8”. Seguidamente questionava: “Olha Feliciano isso vai dar rolo, tu não respeita os mortos?” Feliciano desdenhava e sorrindo dizia: “Que se ferre esta defuntaiada e mais me sobra para beber” Um dia tio Dino combinou com uns jovens o seguinte: eles se esconderiam atrás do muro do cemitério vestidos com lençóis e munidos de paus e taquaras, no momento em que Feliciano erguesse o copo e gritasse, eles sairiam e pegariam o desaforado, dando-lhe um corretivo. Quinta-feira à tardinha de inverno, a noite chegava e os vaga-lumes na beira da estrada davam brilho colorido, no céu o lusco fusco apontava que mais um dia chegava ao seu final. Feliciano chega ao bar e repete a cena. Com o copo na frente do bar ele grita: “E ai defuntaiada vai um gole aí?”. Neste instante os guris pulam o muro do cemitério e puxam Feliciano para dentro do cemitério e cagam a pau o malcriado. O teatino gritava e pedia socorro, mas ninguém ajudou o “pobre”. Apanhou pior que o Maguila naquela luta contra o Hollyfield. Passado quatro dias da coça, Feliciano ainda cheio de hematomas se achegou ao bar do tio Dino estilo gato capado, olhando para os cantos, ressabiado e de olho no cemitério. Quieto tipo nenê com fralda cheia, Feliciano pediu o trago, mas bebeu calado. Tio Dino que é mais curtido que pepino em vidro, não perdeu a oportunidade e lascou: “Che Feliciano eu não te falava que esse negócio de mexer com os mortos daria problema?” Feliciano ainda ajeitando os esparadrapos na cabeça observa “Problema eu achava que não daria, mas o pior de tudo é que só aqui em Morungava enterram os mortos com paus e taquara” afirmou o teatino que sorveu o trago e seguiu seu caminho pelo outro lado da rua com os olhos mais arregalados que gato embaixo da casa e mais apavorado que sapo em cancha de bocha. Nunca mais fez piada com a defuntaiada do Morungava e assim como chegou um dia sumiu e nunca mais foi visto naquelas paragens. 100% Morungava – Tem que ter concurso!

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