sexta-feira, 8 de agosto de 2014

FRITZ E VALDOMIRO: QUE CRUZAMENTO!

Sem querer ser nostálgico em muita oportunidade me sinto um privilegiado e chego aos 5.0 repleto de experiências boas e ruins. Na verdade somos um somatório das experiências que vivenciamos. Tenho pós-graduação na Universidade dos Duros Golpes, mas o que é a vida senão uma eterna caminhada? Cair, levantar e seguir em frente. Criei-me num bairro fantástico, onde todos se conheciam. Onde os vizinhos repartiam o pão, se alguém estava doente não ficava sozinho; desamparado. Criei-me num Rio Branco que há muito não existe. Craque era sinônimo de jogador de futebol. E droga era quando tu errava  uma conta dada pela dona Sally e sentenciava: “Que droga como errei este cálculo?”. Nossas diversões eram os campinhos onde havia embates de rasgar canelas, mas nada que uma salmoura ou o mertiolate não curasse. (Aiiii assooopraaaa...) Não raro os clássicos entre Guarani e Padaria terminavam em pauleiras históricas lembrando Boca e River. Nosso mundo era o Rio Branco e depois da ponte da Andradas havia um mundo desconhecido que só fomos desbravar quando descíamos aos domingos para assistir aos filmes do Teixeirinha no Cine Rio. Onde a gente comprava mentex ou confete no barzinho do seu Armando Dick. Quando passou o Coração de Luto as lágrimas foram tantas que inundaram a Feira Marisa do Tauffic que ficava no andar térreo ao cinema causando sérios danos ao estoque de calças boca de sino e as topecas . Adorávamos assistir ao Canal 100 que mostrava os gols do campeonato brasileiro, isso lá entre 1975 e 79. Fora os campinhos era a televisão e as partidas de bolão no Clube Rio Branco onde ganhávamos uns pilas e refrigerante para armar os pinos, além dos jogos no Oriente nosso time do coração. No bairro vivíamos em comunidade mesmo, onde todos eram filhos de todos, ou seja, todos ajudavam a cuidar, afinal éramos as crianças do Rio Branco. Tive o privilégio de crescer com um grupo de amigos onde a maioria era colorada, exceto, o meu dileto compadre Gilmar Strack; capitão e um dos fundadores do Guarani e o Paulo Vargas outro amigão mais chegado que um irmão, aliás, o Paulinho foi um dos melhores jogadores que tive a oportunidade de jogar. Entendíamos-nos muito, pois ele era inteligente, chutava com os dois pés e só no olhar a gente sabia o que outro iria realizar. Formamos uma bela dupla. Pois este dois eram gremistas, mas sempre nos respeitamos, até hoje é assim, fora a corneta, o resto é amizade plena. Assistíamos muitos e muitos jogos no Beira Rio, inclusive grenais com metade vermelha e metade azul. O ritual era sempre o mesmo alugávamos uma kombi ou então pegávamos o citralão e da Rodoviária seguíamos em romaria rumo ao Beira Rio. Quem organizava tudo era o Remi Cemin “Fritz”; colorado fanático e apaixonado pelo futebol. Lembro que às vezes o Inter perdia um, dois jogos e ai o Fritz dizia: “Nunca mais venho no Beira Rio. Nunca mais estes pernas de pau vão ver a cor do meu dinheiro”. Nós ficávamos apavorados porque o organizador de tudo era ele e como ficaríamos sem ir ao Beira Rio e ver o colorado? Porém chegava o domingo e a gente estava no Bar do seu Arnildo ali na Andradas quase ao lado do estádio do Oriente, onde jogávamos sinuca e lá vinha o Fritz que chamava todo mundo de amarelo. Ele olhava para a gente e perguntava: “E ai amarelo vamos no Beira Rio hoje?” Imediatamente alfinetava “Olha Fritz domingo passado tu disse que nunca mais iria assistir os jogos do Inter” Ele abria um sorriso enorme e dizia: “Tu tá ficando louco amarelo eu não falei nada disso. Como é que vamos deixar o colorado empenhado? Se nós largar o que será do timão? Já aluguei a kombi do seu Otacílio e vamos sair as 13 horas” dizia com sorriso de orelha a orelha. E lá seguíamos nós em direção ao Gigante para assistir as partidas da orquestra comandada pelo maestro Falcão, Carpegiani, Figueroa, Dário, Flávio, Lula e tantos outros.... Um dia memorável, assistíamos Inter e Cruzeiro e a partida estava difícil, inclusive Roberto Batata já tinha chutado uma bola no travessão. O primeiro tempo terminou zero a zero. Fomos ao banheiro e ao retornarmos estava lá o Fritz roendo as unhas, até aí tudo bem, todo mundo ou a maioria roe unhas durante jogos, não, mas nosso herói roía as unhas do pé. Pena que naquela época não havia celular com máquina fotográfica para eternizar este momento lúdico ou “podológico”. Neste mesmo jogo aos 27 minutos da etapa complementar, Valdomiro lançado pela direita correu, venceu o lateral e ao cruzar, o Fritz cruzou junto, o Valdomiro acertou no segundo pau, bem na cabeça do Escurinho, já o Fritz acertou um chute potente bem na “paleta” de um sujeito que mais parecia o Montanha; lutador do Ringue 12 Marinha Magazine (lembra? Estou velho né?) por sorte a bola achou a cabeça certeira do maior cabeceador de todos os tempos: Escurinho que pulou de pernas abertas e cabeceou no canto esquerdo de Raul.  Na comemoração nos abraçávamos e gritávamos e o sujeito que levou o chute nas costas vibrava abraçado no Fritz, ambos chorando de alegria. Após o cachorro quente e o guaraná charrua ou minuano limão, que, aliás, muitas vezes um cachorro quente e um refrigerante era dividido entre cinco ou seis. Sempre desconfiei que praticávamos lições de solidariedade, mas sobretudo, ali tive minha iniciação ao socialismo democrático. No Beira Rio aprendi que a gente cuida dos filhos dos outros enquanto vão ao banheiro. Que a gente abraça e chora com pessoas que você nunca viu antes.  Retornávamos a Campo Bom domingo a noite pela não engarrafada BR 116 de alma lavada, sem esquecer das revistas do Inter produzidas pelo Elmar Bones e o Polidoro, nas quais o L.F Veríssimo, o Érico e o Jockymann escreviam textos geniais e ainda chegávamos a tempo de assistir ao Jogo Aberto com Larry Pinto de Faria, Atayde Viana, Geraldo José de Almeida e tantas outras feras da TV Difusora canal 10 (Hoje Band). Passávamos a semana inteira esperando o domingo chegar. Decididamente éramos felizes e não sabíamos, ou, melhor a gente sabia sim!
*Jair Wingert; jornalista.

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