sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

O GAÚCHO DO HIPOGLÓS

Nas paragens de Morungava seguidamente aportava diversos tipos e muitos destes ajudaram a construir o folclore da cidade. Muitos destes araganos para não dizer teatinos fixaram residência no Morungava, casaram e constituíram família e hoje estão inteiramente adaptados aos usos e costumes. E num passado não muito distante do dia para noite apareceu no sitio do tio Dino um sujeito pêlo duro, cor de cuia, personagem típico vindo da fronteira que atendia pelo nome Eucares e estava em busca de emprego. Recém havia deixado o 6º Regimento de Cavalaria do Alegrete e ninguém ao certo sabe porque parou no Morungava. Sentado  no galpão  sorvendo um mate, tio Dino ouviu o jovem Eucares e se compadeceu do mesmo e contratou seus serviços, só que de pronto foi avisando o gaudério que a vida de tropeiro era coisa das brabas e que muitos não agüentavam o tirão. Nesta época tio Dino buscava gado em cima da serra, lá para as bandas da Vacaria, Bom Jesus e São Francisco. Tempos difíceis principalmente nos invernos onde no Rio Grande do Sul ao invés de habitantes existem sobreviventes. Noites dormindo no relento, tendo como abrigo galpões cedidos pelo caminho e o poncho velho como coberta. Não raro se dormia embaixo de figueiras centenárias, tendo o cruzeiro do sul e as três marias como teto. Não raro uma estrela cadente varava o céu e pedidos eram feitos. A gastronomia: comida campeira, arroz carreteiro com charque, feijão com couve e moranga, churrasco e café de chaleira com tição de brasa e as prosas intermináveis ao pé do fogo de chão nos acampamentos, que não raro giravam em torno de assombrações, boi tatá e tesouros enterrados pelos estancieiros nos períodos de revoluções e até da guerra dos farrapos assim eram as tropeadas e os tropeiros. Muitas  vezes as comitivas levavam uma semana na estrada para trazer o gado para o matadouro do Maroni que abastecia de carne Gravataí e os demais municípios que integram a grande Morungava.. Eucares velho de guerra aceitou o serviço em troca de uns pilas, alojamento e comida. Mesmo sem experiência na lida campeira, pois sempre foi guri da cidade, morava na Cidade Alta, mas estudou no bom e velho Lauro Dornelles. Na primeira tropeada lá perto de Vacaria desabou uma chuva de molhar a alma do vivente e o Eucares com o poncho "véio" todo molhado se deslocava numa troteada desgovernada tentado alcançar os demais integrantes da comitiva e no meio da ventania, Eucares caiu do cavalo e os tropeiro de longe viram a cena, o gaudério do Alegrete quase levantou vôo e ao longe  Eucares caindo e o poncho levantando parecia que ele havia saltado de pára-quedas. No acampamento a conversa foi sobre o Eucares o gaúcho de pára-quedas. Ao amanhecer os tropeiros liderados pelo Arcedino Nunes “tio Dino”, após lavar o rosto na cacimba e tomar café de cambona, com pão de queijo, salame e cuscuz começaram arrumar os apetrechos. O poncho era meticulosamente enrolado como um charuto e colocado na parte traseira do lombo do cavalo. O velho Eucares não conseguia enrolar o dito poncho e para não dar o braço a torcer e pedir ajuda, fez o que pode e ajeitou o poncho que com a cavalgada se abriu e vinha balançando para todo lado mais parecendo uma mala de garupa. A noite a conversa dos tropeiros girou em torno de Eucares “o gaúcho da mala de garupa”. Mais brabo que marimbondo em lixiguana estucado com taquara embebida em estopa com querosene, Eucares ficava num canto indignado com a gozação. No terceiro dia de cavalgada, tchê Eucares quase não podia caminhar, havia assado as virilhas de tal forma que estavam em carne viva. Calmamente tirou um tubo de hipoglós e se espreitou para dento de um capão como quem vai fazer as necessidade (passar um fax, largar um barro ou tirar a água do joelho, ou tudo junto). No meio do mato de camboim Eucares arriou a bombacha e não poupou na pomada. Ao retornar para o acampamento, pensando que ninguém o viraEucares sentou no meio da turma e não levou tempo para a gozação e aí tínhamos Eucares “o gaúcho do Hipoglos”. Este foi o batismo de sangue do índio velho do Alegrete que se transformou num grande tropeiro e permaneceu no Morungava por quase 10 anos até que retornou ao seu torrão natal. - Jair Wingert

Nenhum comentário:

Postar um comentário