segunda-feira, 16 de setembro de 2013

O CRAQUE DO TWITTER F.C.

Dudu cresceu num bairro pobre do Vale do Sinos, filho de pais sapateiros que vieram na época do Eldorado do Sapato nos anos 80, quando a Carteira Profissional era confeccionada pela manhã e a tarde a  pessoa já estava empregada. Depois vieram as crises cíclicas e a ameaça dos Tigres Asiáticos (China). Dudu assim se chamava em homenagem ao avô paterno; Eduardo de Arruda Miranda; agricultor das bandas de Santiago do Boqueirão. O menino Dudu logo cedo demonstrava habilidades com a bola e já na escola pegou a fama de craque. Todos no momento da escolha dos times queriam Dudu na equipe. Aos domingos pela manhã nas peladas no campinho do bairro o pequeno Dudu era atração, alguns a boca pequena diziam: “Vai jogar no Colorado ou Grêmio” outros afirmavam que souberam pelo filho, do padeiro que o irmão do motorista ouvira falar que havia um empresário de Porto Alegre de olho no guri. Na verdade Dudu gastava a bola. O guri era do tipo atrevido, daqueles estilo Romário “marrento”. Drible da vaca,  “meia lua”,  “lambreta” que para nós gaúchos é “Chaleira”, e até os famosos “paninhos” eram peculiaridades do futuro craque do Vale do Sapateiro. Por ser uma espécie de gênio precoce, Mangel, o técnico da equipe do bairro Jardim do Sol, o glorioso Corinthians “O Coringão do Morro”, escalava Dudu mesmo com 13 anos no segundo quadro e com a 10. O menino roubava a cena, a torcida chegava cedo ao campo para ver os dribles e arte contagiante de Dudu. Não raro tinha mais torcida nos jogos do segundo do que do primeiro quadro. Todos queriam ver Eduardo “Dudu” e sua genialidade. Gols de falta então era outra especialidade, de três dedos por cima da barreira. Ele batia no estilo Zico, Tadeu Ricci e de Andrézinho, tomava pouca distância a exemplo do velho mestre Enio Andrade,  batia sempre procurando ultrapassar por cima do terceiro homem da barreira e a cada dez faltas cobradas pelo guri, oito se aninhavam onde a coruja dorme. Apesar de ninguém fotografar, na maioria delas, o goleiro nem na foto saia!  Agora então surge a oportunidade de Dudu, uma porta se abre em uma escolinha de uma equipe de fora do Rio Grande do Sul, mas com uma extensão na região do Vale do Sinos. Dudu morava na área da escolinha num bonito alojamento, recebia um bom salário e um empresário era detentor dos direitos do passe do garoto por 20 anos; tudo graça a Lei Pelé. O salário de 8 mil reais ajudava e muito a família do menino. Até uma garagem o pai do craque construiu e aproveitou para rebocar e pintar a residência internamente e comprou a vista um TV “led” para assistir os jogos da Copa. Agora na vila, Dudu apenas assistia aos jogos do Corinthians, o máximo que fazia na beira do gramado, próximo ao para-peito de eucalipto, era embaixadinhas para suspiros dos menores que se espelhavam em Dudu. Quarto com ar condicionado, televisão e até computador com acesso a internet assim era vida do futuro craque no alojamento da escolinha. Por último um telefone celular de última geração. Dudu agora passava a maior parte do tempo na frente do computador conectado no face, iphone e outras parafernálias clássicas da era cibernética em que estamos inseridos. Mas a grande paixão de Dudu era o twitter. Chegava a faltar aos treinos para ficar “twitando”. Era uma espécie de vicio escravizante ao ponto de acabar com o futuro craque. Domingo ensolarado, manhã bonita de primavera e a escolhinha de Dudu decidia o título de juvenis (até 17 anos) com uma grande equipe da capital treinada por um ex-goleiro campeão do mundo no Japão em 2006. Um grande empresário estava no estádio para ver Dudu e comenta-se que o objetivo seria levá-lo para a Europa. O menino estava apático durante toda a partida. No intervalo no vestiário enquanto o técnico fazia a preleção, Dudu “twitava” num canto, alheio ao que o “ coach” dizia.  A vida de Dudu mudou drasticamente aos 37 minutos da etapa final, a partida estava zero a zero , o ponteiro  direito entrou em diagonal, cruzou e na frente do gol, somente Dudu e o goleiro adversário, a bola outrora a maior paixão do menino gênio se mostra sozinha, pronta para ser tocada para o fundo das redes. Era só bater, correr para o abraço, levantar a taça e assinar o contrato com o clube Europeu, porém Dudu estava absorto, desligado. Um misto de surpresa e desespero se abateu no estádio, tudo porque Dudu nem ligou para a bola, pelo contrário, tirou do calção, não um “cachimbo” como Renteria do Inter certa feita tirou, ou uma chupeta como Carlito Tevez. Dudu tirou o telefone do bolso e passou a “twitar”. A bola passou por ele, a vida passou por ele, o sonho passou pelo precoce menino que era craque no campo, mas escravo da cibernética, “dependentes químicos” dos equipamentos do homem pós-moderno e tão solitário. Onde estão os campinhos dos bairros? Onde estão os meninos correndo atrás de uma bola? Onde estão os Dudus que fazem embaixadas com a pobreza e driblam a marginalidade com a esperança no olhar?

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