sexta-feira, 25 de setembro de 2015

AINDA SOMOS O CLUBE DO POVO?

O grande maestro Paulo Riberto Falcão (8ª Rei de Roma) também pegou junto nas obras de construção do Beira Rio. Neste periodo o “Bola-Bola” era das categorias de base.
Nasci colorado e desde pequeno minhas primeiras palavras foram: gol do Inter! 
Minhas doces recordações dos anos 70 no Rio Branco eram gols do Valdomiro em grenais narrados pelo Ranzolin ou pelo Haroldo de Souza, um dos melhores narradores em atividade da América do Sul. O magrão é ninja. 
Comecei a assistir jogos no Beira Rio em 1975 com aquele time dos sonhos e me desculpe os defensores do futebol medíocre que nos levou ao 7 a 1 para Alemanha, mas eu vi, meninos eu vi Falcão jogar. Vi Paulo César Carpegiani o melhor 10 da história colorada. Tive o privilégio de ver Escurinho entrar aos 30 minutos da etapa final e aos 44 minutos calar o nosso adversário que na época tinha endereço na Azenha, hoje no Humaitá num estádio pertencente a OAS (aluguel). Vi Valdomiro, Dario, Flávio, Lula e Manga. Tive a alegria de ver Figueroa; a lenda viva jogando com a 3. Vi o gol iluminado em 14 de dezembro de 1975 na goleira do placar contra o Cruzeiro. Você que é jovem senão viu Figueroa jogando, lamento te dizer: você nem sequer sonhou! Vi o príncipe Jair e o grande Flávio Bicudo. Depois vi Mário Sergio fazer sonetos com a bola. Vi Mauro Galvão e sua elegância sutil. Perdoe o atrevimento, mas naqueles tempos jogadores como Edinho, Nico Freitas e outros brucutus; quebradores de bolas serviam apenas para buscar bola atrás da goleira e nas laterais. Naquela época Jurássica a gente chamava de “marrecão”, hoje gândula. 
Mas o enfoque é quanto a elitização do futebol. Hoje o futebol se tornou um esporte para ricos e abastados e isso foi organizado com objetivo de tirar o trabalhador de dentro do estádio. Ingressos a 60, 80 reais (os mais baratos), mais transporte, lanche lá se vão 130 reais no mínimo. Sabe o que isso representa? Representa o afastamento do povo, do clube do povo. Entre o colorado e o pão das crianças, a luz, água e aluguel, o sujeito opta pela sobrevivência é óbvio. 
No estádio Beira Rio cada vez que a TV filma a torcida aparece só gente bonita. Não me entendam mal, acredito que é preciso se modernizar e hoje temos um dos melhores estádios particulares do mundo. Somos um clube com quase 150 mil sócios. Penso que a classe alta deve ter presença no Beira Rio, mas por outro lado não podemos afastar a família colorada do Gigante. Nos meus tempos de Rio Branco a gente alugava uma Kombi e seguíamos para o Beira Rio todos os domingos. Não raro a viagem era de ônibus – Citral ou Centralão. Sou do tempo da Coreia, do tempo em que ao retornar do Beira Rio pela Borges em direção a Rodoviária, seguíamos a pé. No caminho de forma socializante dividíamos entre cinco, um cachorro quente e uma guaraná.... Uma bocada para cada um. Um cachorro com tempero esperança! E o grito ecoava nas ruas da capital mais linda do Brasil “É campeão...É campeão...É campeão...” A gente era feliz e sabia! 
Sou do tempo em que sentava ao lado de um velho colorado de chinelo de dedo, radinho de pilha e uma velha almofada de plástico onde se lia: Inter bi-campeão gaúcho 1969 e 70 (depois enfileiramos oito títulos consecutivos no rabo deles). A torcida que frequentava o Gigante tinha cara e cheiro de gente... Tinha jeito de torcida do Clube do Povo, porque era formada pelo povo. Povo este que ajudou a construir o Beira Rio. Nas paredes do Gigante tem histórias de sofrimento e abnegação de colorados de todas as partes do Rio Grande e do Brasil que deixavam de comer um pão com salame para comprar dez tijolos levar no sábado pela manhã nas obras. Tinha outros que a noite saiam a recolher tijolos e ferros “doados” em construções pelo Rio Grande a fora. 
Sou do tempo em que éramos uma família e que se o sujeito que estava ao teu lado ia no banheiro tu ficava cuidado do filho dele. Sou do tempo em que quando o Dario fazia um gol no grenal tu abraçava o cara que estava ao teu lado e que tu nunca viu mais gordo, mas mesmo assim tu o abraçava e chorava... E não importava se o sujeito tinha apenas um dente na boca, afinal ele fazia parte da tua família, da família colorada. Havia as cadeiras e a social que era destinada aos colorado que tinham mais posses, mas também eram colorados tanto quanto nós. 
Hoje o povo do clube do povo está escanteado. A família colorada acompanha o Inter pela TV ou pelo rádio. No estádio? Uma vez por ano em jogos em que vendem ingresso a 20,00 reais, mas colocam o torcedor no pior lugar do estádio. O Internacional precisa voltar a ser clube do povo. Os jovens precisam urgentemente se organizar, fortalecer correntes e ocupar espaços, porque somente os jovens poderão mudar os rumos da história do Inter e fazer com que além de voltar a ser clube do Povo; o colorado reconstrua sua senda de vitórias e não venhamos nos contentar em ganhar gauchão, sonhar com vaga na Libertadores. 
Os atuais dirigentes estão com prazo de validade vencido. Cumpriram importante papel, mas é hora de abrir espaços e sair de cena. O Inter precisa de uma gestão moderna e a profissionalização urgente do cargo de diretor de futebol. A eleição deve ser no pátio, ou seja, os sócios precisam eleger o presidente e ai o segundo passo é criar mecanismos que possibilitem o retorno do povo para dentro do Clube do Povo. E ai sim neste dia poderemos, colorados ricos, pobres, brancos, negros, árabes, judeus, homens, mulheres, idosos ou crianças cantar juntos numa festa da integração, numa apoteose da família colorada: “A camisa vermelha... O Gigante me espera para começar a festa....”
*Texto: Jair Wingert; jornalista e colorado de coração! – Campo Bom. RS
Este estádio precisa ser frequentado pelo povo, pela Família Colorada.

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