Bar de frente pro futuro ficava na beira da estrada bem na frente do cemitério de Morungava |
Se tem um ponto turístico em
Morungava além é obvio das cascatas, matas preservadas, sítios de lazer e
o Morro do Itacolomi é o cemitério. Nos dias de finados é uma “festa”
de tanta gente viva em romaria para acender velas e levar flores aos
seus mortos, aliás, os mortos de Morungava a maioria tem mais de 80
anos. Lá ninguém morre jovem, de ataque cardíaco, derrame e outras
doenças do mundo consumista. Depressão? Só a de 1929 que quebrou os
Estados Unidos. Estresse? Para que estresse se a vida é bela. Em
Morungava ninguém sofre por antecipação e após o almoço a ciesta é certa
e reparadora. Nos finados, barracas comercializando flores, ambulantes
vendendo pasteis, água mineral e outros produtos que ajudam no aumento
do colesterol, triglicerídeos e outras doenças modernas. Bem na frente
no cemitério tio Dino era proprietário de um bar que tinha um nome
sugestivo especialmente aos pinguços “Bar de frente pro futuro” que
apontava justamente para o “campo santo”, última morada, lugar dos pés
juntos, lugar onde o pobre e o rico fedem iguais, às vezes o rico fede
mais ainda. Esta semana o velho Dino me ligou e quando ele telefona
quase sempre é indignado. Desta feita sua indignação é com relação ao
chamado banho de gelo que os ricos e famosos estão fazendo. Ele já chega
atravessando, cuspindo marimbondo, soltando fogo pelas ventas “Tu já
viu este negócio que a burguesada está fazendo? Este troço de banho de
gelo, isso é viadagem de quem não tem o que fazer. Vão carpir uma roça,
ou pintar uma creche ou uma escola. Vão cantar num asilo, vão visitar as
crianças com câncer nos hospitais de Porto Alegre. O pior é que esta
bosta começou lá na terra do tio Sam e o brasileiro que gosta de imitar
já está aderindo e depois ficam bravos que o Maradona nos chama de
macacos” alerta tio Dino. Mas depois mais calmo ele contou uma história
pitoresca ocorrida nos tempos do “Bar de frente pro futuro” Lá no
Morungava nos anos 70 apareceu um teatino que alguns acreditavam ter se
refugiado na cidade em função da ditadura, outros pensavam que podia
ser um espião do “Dops”. Na verdade Feliciano se arranjava trabalhando
em sítios e pequenas propriedades de Morungava, ajudando na roça e no
campo na lida com o gado. Final de tarde chegava ao bar onde cumpria um
ritual, pedia um martelo (copo) com cachaça do Monjolo produzida pelo
Antônio Selistre “Toninho Gordão”, pai do Vicente Selistre, com biter.
Feliciano na frente do bar e sob o olhar contrariado dos clientes erguia
o copo e olhando para o cemitério dizia: “E ai defuntaiada vai um gole
aí?” Isso acontecia de segunda a sexta-feira e tio Dino sempre
respeitador ficava bravo com a postura do teatino Feliciano do “Dops ou
do MR8”. Seguidamente questionava: “Olha Feliciano isso vai dar rolo, tu
não respeita os mortos?” Feliciano desdenhava e sorrindo dizia: “Que se
ferre esta defuntaiada e mais me sobra para beber” Um dia tio Dino
combinou com uns jovens o seguinte: eles se esconderiam atrás do muro do
cemitério vestidos com lençóis e munidos de paus e taquaras, no momento
em que Feliciano erguesse o copo e gritasse, eles sairiam e pegariam o
desaforado, dando-lhe um corretivo. Quinta-feira à tardinha de inverno, a
noite chegava e os vaga-lumes na beira da estrada davam brilho
colorido, no céu o lusco fusco apontava que mais um dia chegava ao seu
final. Feliciano chega ao bar e repete a cena. Com o copo na frente do
bar ele grita: “E ai defuntaiada vai um gole aí?”. Neste instante os
guris pulam o muro do cemitério e puxam Feliciano para dentro do
cemitério e cagam a pau o malcriado. O teatino gritava e pedia socorro,
mas ninguém ajudou o “pobre”. Apanhou pior que o Maguila naquela luta
contra o Hollyfield. Passado quatro dias da coça, Feliciano ainda cheio
de hematomas se achegou ao bar do tio Dino estilo gato capado, olhando
para os cantos, ressabiado e de olho no cemitério. Quieto tipo nenê com
fralda cheia, Feliciano pediu o trago, mas bebeu calado. Tio Dino que é
mais curtido que pepino em vidro, não perdeu a oportunidade e lascou:
“Che Feliciano eu não te falava que esse negócio de mexer com os mortos
daria problema?” Feliciano ainda ajeitando os esparadrapos na cabeça
observa “Problema eu achava que não daria, mas o pior de tudo é que só
aqui em Morungava enterram os mortos com paus e taquara” afirmou o
teatino que sorveu o trago e seguiu seu caminho pelo outro lado da rua
com os olhos mais arregalados que gato embaixo da casa e mais apavorado
que sapo em cancha de bocha. Nunca mais fez piada com a defuntaiada do
Morungava e assim como chegou um dia sumiu e nunca mais foi visto
naquelas paragens. 100% Morungava – Tem que ter concurso!
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