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Estrada da Barrinha.... paisagem magnifica de um lado o Sinos e do outro sítios. |
Tarde quente e no horizonte nuvens acinzentadas dão prenúncios de chuva no final da tarde. De posse da minha Huston, ou melhor, da Lídia que ganhou num sorteio da Padaria do Alemão no Rio Branco no natal, preparei-me para dar umas pedaladas por Campo Bom. Ao ingressar na Avenida dos Municípios um questionamento, por que não pedalar até Lomba Grande, por que não? Segui o rumo do meu próprio coração sem capacete, sem pedômetro e sem os apetrechos necessários utilizados pelos mais experientes, mas como diz o Almir Satter “ando devagar porque já tive pressa”. Apenas a bicicleta, eu e a máquina fotográfica. Adentramos na ponte da Barrinha que ainda hoje permanece com apenas uma pista e me deixa pensando: que caos seria se houvesse um acidente. Ao iniciar as pedaladas pela Rua Pio XII circundando o nosso Rio dos Sinos já antevi que seria uma aventura fantástica, a dúvida era até onde as pernas aguentariam. Ai lembrei-me de um maratonista já velho e que havia vencido uma prova e respondeu a um repórter como ele havia vencido percorrendo 42 quilômetros, o velho estilo lobo da estepe respondeu: “Não corri 42 quilômetros, corri de um poste ao outro, minha meta era chegar a cada poste, se focasse no percurso não teria completado a prova, muito menos vencido”. Heureca: não foquei em Lomba Grande e sim em cada poste, cada sítio... Mas voltando a exuberância da paisagem do nosso Sinos, a cada curva um lugar mais bonito que o outro, porém o contraste existe, lixo jogado nas margens do rio, sacolas plásticas repleta de restos de empresas, restos de couro ou derivados as margens e o pior de tudo é retrato da falta de fiscalização são as árvores caídas dentro do rio vitimas da ação sórdidas das dragas que retiram sem dó e sem piedade a areia de forma predatória, o que vem transformando a paisagem do Sinos. Até quando? Tudo pelo progresso, mas a que preço? Outra cena terrível são cães e gatos que são abandonados na Rua Pio XII. Um ser humano que é capaz de deixar na beira de uma estrada, um cão que serviu de guarda, que o esperava latindo e fazendo a maior festa quando retornava, agora, porém que está velho e doente é relegado a este triste fim, me desculpe pode ser chamado de tudo, menos de humano. Faço minhas as palavra célebres do mestre Buffon “Plus jê connais les hommes, plus j´aime les animaux”, “Quanto mais conheço os homens mais amo os animais”. A cada pedalada um universo magnifico se descortinava e que há muito eu havia esquecido. A via moderna o uso do carro faz você se afastar de tantas coisas boas e simples desta vida. Ao lado direito, sítios, algumas cabeças de gado e até uma hospedaria para cavalos, onde os cuidadores mateavam a sombra de um ingazeiro. Incrível, o chimarrão é a bebida mais democrática que existe, ali todos são iguais, no ritual quase místico do chimarrão, patrão e peão são literalmente iguais, pois bebem na mesma cuia. Acrescentaria ao “Veda” do mate amargo algo que pode soar atrevimento, mas o chimarrão ao meu modesto modo de ver é uma bebida que além de integrar, ela na sua essência é socialista. Logo em frente após o sitio do meu amigo Sadi Santos está se formando uma espécie de túnel verde, onde as árvores das duas margens da estrada estão se interligando num espetáculo lindíssimo. Pelo Rio dos Sinos aportaram os imigrantes que construíram a riqueza desta região, mas em contrapartida observo que nós viramos as costas para o Sinos, as cidades se desenvolveram de costas para o rio que nos deu vida e trouxe desenvolvimento. Em algumas margens pescadores estão ali com seus caniços, nem tanto para pegar peixe, mas, sobretudo para desopilar, espantar o estresse. Em uma das clareiras, três homens tinham esperas de linha jogadas ao rio e linguiças assando sobre um braseiro. O cheiro convidativo, mas a disciplina de pedalar e chegar ao destino falou mais alto. Na frente da Tenda dos Sucos, aliás, um dos melhores sucos da região, com atendimento excelente, pois na beira da barranca pescando com molinete e linha, meu amigo Fábio Moto Boy que confidenciou sua paixão pelo rio e que seguidamente busca refúgio nas margens do Sinos, local segundo Fábio propicio para meditar, pensar na vida e ouvir o silêncio da águas, outrora “Rio dos Ratões do Banhado”, nome dado pelos índios que aqui viviam. O conjunto de espécies animais distribuídas por toda margem do Rio dos Sinos é abundante e inclui cará, lambari, grumatã, mussum, barrigudinho, gavião carijó, caracará, pica-pau do campo, socó boi, tico-tico, tesourinha, suiriri, bem-te-vi, e outros animais em extinção que habitam o rio dos sinos são: a lontra, o jacaré-do-papo-amarelo e o cisne do pescoço preto. Algumas espécies vegetais da flora do vale do Rio dos Sinos são o ingá, o salgueiro, o sarandi, a açoita-cavalo, o corticeiro, bromélias, orquídeas, e outras. Em outra curva vislumbramos a Olaria Ritter e um açude maravilhoso. Próxima parada a bifurcação em Santa Maria dos Caboclos ou do Butiá como alguns desejam, a esquerda seguimos em direção ao Gomerço, Morro da Pedra, Pinhal, Pega Fogo, Fialho, Figueirão, Vira Machado e Taquara. A direita segue-se para Lomba Grande, não sem antes parar e admirar a Igreja Católica da Santa Maria. Não muito longe da Igreja na estrada em direção a Lomba Grande encontro um menino que de forma solicita atende ao meu pedido para fotografar este aventureiro. Ao dialogar descobri que o Junior o referido menino é filho de um amigo querido, o Roque Marconi Melo; grande bancário, funcionário do Banco do Brasil de longa data, onde cumpre uma importante função. Fui colega do Roque em 1978, na Escola Ildefonso Pinto. Trata-se de um cidadão de bem, de um exemplar chefe de família e sem falso elogio, pessoas do nível de um Roque deveriam nascer em maior escala. Foto tirada para comprovar a aventura deste jovem 5.1, segui em frente e na estrada próximo a Lomba Grande fui saudado por um beija-flor dando-me as boas vindas. Ao chegar à Lomba me senti em casa, aliás, minha história com este lugar remonta de muito tempo, pois minha mãe quando criança chegou a morar na Lomba Grande. Tenho alguns sonhos, um deles é fazer o Caminho de Santiago de Compostela (800 quilômetros), caminho da França a Espanha, culminando com a chegada à Catedral de Compostela onde está sepultado o apóstolo Tiago, outro sonho é morar na Lomba Grande, ou melhor, adquirir um sitio ou casa neste bucólico lugar. Seu casario em estilo germânico e a rua principal com seu comércio e as pessoas com sorriso fácil, dão demonstração que mesmo dentro da loucura do estresse cotidiano é possível andar devagar. Eles, os lomba-grandense sorriem com facilidade e te apertam a mão ao cumprimentar. Missão cumprida retornei ao anoitecer em algumas partes fui brindado por uma escolta de vagalumes. Foram 16 quilômetros para ir e mais 16 para retornar, num total de 32 quilômetros. Um bom começo para um lobo solitário. No dia seguinte alguns dores musculares, mas a certeza de que muito em breve faço o percurso novamente, eu, a Huston, a máquina e mais alguns amigos e familiares que estiverem dispostos a pedalar.
Texto e Fotos: Jair Wingert; jornalista.
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Ao lado direito sentido Campo Bom/Santa Maria a paisagem é belíssima. Uma velha árvore resiste como os homens de bem, que envergam mas não quebram. |
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Fábio Moto Boy num momento de descontração na barranca do nosso Sinos |
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Na frente da Igreja da Santa Maria dos Caboclos, quem não tem “pau de salfe” improvisa né meu. |
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Seguindo para Lomba Grande fotografado pelo Junior, filho do meu amigo Roque. |
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Na estrada para Lomba Grande a paisagem não tão distante dos Morros de Dois Irmãos e Campo Bom logo abaixo. |