segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

TIA MIÚDA ESTÁ SURDA

Domingo pela manhã segui para Morungava objetivando almoçar com tio Dino e tia Miúda. Chegando no sitio fui recebido no portão pelo surtão que fez uma festa, mas adiante o Sarney; o gato estava deitado em cima do saco; do saco de batatas.O velho Dino depois dos cumprimentos convidou-me para dar uma caminhada pelo campo. Bate papo descontraído falei para ele que o sucesso do Blog se deve muito as suas histórias e que inclusive o Decão e o Caruso lá na China estão pensando em levá-lo para um contar causos na Praça Vermelha. Olhar apreensivo, tio Dino me confidenciou sua preocupação com relação a tia Miúda. Ele relatou que telefonou ao médico, Dr. Podalirio para marcar uma consulta para a tia. A secretária pergunta:  “Qual o problema da dona Miúda?” De pronto tio Dino diz: “Surdez. Não ouve quase nada”  Então o senhor vai fazer o seguinte: antes de trazê-la, faz um teste para facilitar o diagnóstico do médico.  Sem ela olhar, o senhor, a certa distância, fala em tom normal, até perceba a que distância ela consegue ouví-lo. E quando vier, diz ao médico a que distância o senhor estava quando ela o ouviu. - Certo?”, questionou a secretária.  “Está certo”, consentiu o velho morungavense..  À noite, quando a tia Miúda  preparava o jantar, o Dino velho decidiu fazer o teste.  Mediu a distância que estava em relação à mulher. E pensou: "Estou a 15 metros de distância. Vai ser agora"  Miúda, o que temos para jantar?  Silêncio. Aproxima-se a 10 metros: Miúda, o que temos para jantar? Silêncio. Fica a uma distância de 5 metros: Miúda, o que temos para jantar? Silêncio. Por fim, encosta-se às costas da mulher e volta a perguntar: Miúda! O que temos para jantar? “Frangooooooooooooooooooooooooooooooo, ...  Nossaaaaaa!  É a quarta vez que eu respondo. Tu tá ficando surdo Dino?”

Tio Dino e o boi turbinado
Um destes bundinhas de Gravatai cheio de grau, querendo se aparecer assim de pegar um abuso, daqueles que só dando com um gato morto na cabeça comprou uma Ferrari novinha, e para estrear, veio para Morungava pela estrada afora, passando pelo salão do Anselmo, pela frente da Igreja, bem devagarzinho para fazer pose para as gurias, avista à frente uma carroça puxada por uma junta de bois e o condutor advinha??? Tio Dino. O engomado da cidade pensa: engata uma segunda e passa rente à carroça do tio dando um fininho. Nisso, olhando pelo retrovisor, ele vê que a mesma carroça vem lhe perseguindo e vai chegando perto numa velocidade animal ! E passa.... VUMMMMMM ! O cara, abobado, engata uma terceira e acelera pra ultrapassar a carroça viajando a mil e pilotada pelo tio Dino. Dai vem a carroça de novo, passando a Ferrari novinha. Já doido, ele engata uma quinta direto e mete fundo, passando mais uma vez a carroça, agora já a 200 por hora. Hã, lá vem a carroça.... VUMMMMM! Nisto, eles chegam no cruzamento perto da faixa e a Ferrari é forcada a frear. E a carroça : VUMM (pra frente)... VUMM (pra trás)... VUMMM... O bóizinho metido e facão sem cabo abaixa o vidro e pergunta para o tio Dino: “ Qual é  dos bois que é turbinado?” E o velho Dino mais apavorado que sapo em cancha de bocha diz : - Moço, dá para tirar o meu suspensório que está preso na sua antena!!!!???? Tem que ter concurso – 100% Morungava.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

MORREU ABRAHÃO LERMAN

Massagista do Cruzeiro de Porto Alegre por mais de 40 anos, Abrahão Lerman morreu na terça-feira 14.02, aos 87 anos, após complicações decorrentes de uma cirurgia no intestino. Ele estava internado no Hospital de Pronto Socorro (HPS) da Capital.O Cruzeiro sempre foi uma paixão de Lerman. No clube, começou como goleiro. Depois, com 22 anos, tornou-se massagista do time, função que exerceu por mais de quatro décadas. Por isso, é comum vê-lo nas fotos históricas da equipe. Abrahão integrou a equipe do Cruzeiro; primeiro clube gaúcho a excursionar pela Europa em 14 jogos (1953/54).
Em 1987, com o departamento de futebol do Cruzeiro desativado, Lerman passou a trabalhar com os árbitros. Foi massagista do Sindicato dos Árbitros de Futebol do Rio Grande do Sul até novembro passado. Além dos juízes gaúchos, costumava atender a profissionais de outros Estados que vinham apitar jogos de Grêmio e Inter em Porto Alegre.Ele fez amizade com gente como o Arnaldo Cezar Coelho (ex-árbitro, hoje comentarista) e o Armando Marques (ex-presidente da Comissão Nacional de Arbitragem).
O seu Abrahão como era carinhosamente chamado era considerado um dos melhores massagista do Brasil. Ele tinha em Campo Bom grandes amizades especialmente com o técnico Gilberto Wingert (15 de Novembro, Oriente, Cairú, Lomba-grandense e outros). Quando um atleta tinha um caso grave, para Porto Alegre se deslocava o Gilberto levando o jogador até o seu Abrahão que sempre  recebia em seu apartamento os pacientes com sorriso largo e cheio de histórias; uma verdadeira enciclopédia do futebol. Valia a pena ouvi-lo. Um homem de bem que fez de sua profissão uma lição de amor, honestidade e abnegação.  Sua esposa dona Amantina; colorada doente sempre nos recebia com carinho e não obstante convidava para uma xícara de café ou chá acompanhado de biscoito. Em muitas oportunidade dona Amantina e seu Abrahão foram presenteados com sapatos produzidos em Campo Bom, principalmente da marca Fillis.  Posteriormente dona Amantina adoeceu e a gente sentia que seu Abrahão sofria junto e o olhar do velho massagista perdia o brilho em função da enfermidade da eterna companheira que o acompanhava aos estádios; principalmente no Beira Rio. Na mesa de massagem com um aparelho “milagroso”, inventado pelo próprio, o velho e bom Judeu fazia milagres. Recordo uma oportunidade em que perguntado sobre o um atleta de Campo Bom que ele estava fazendo a massagem, se o mesmo poderia jogar no domingo, com um charuto cubano no meio dos dentes, com sorriso maroto e olhar aquilineo, o velho Abrahão lascou: “Olha Gilberto, ele só não joga se for mascarado, do contrário poderá jogar”. O último contato que tive com seu Abrahão e pude abraçá-lo foi em 2005 na final do gauchão contra o Inter no Estádio Sady Schmidt. Naquela decisão onde o Colorado venceu na prorrogação com dois gols de Souza; aquele que atua no Bahia. Seu Abrahão atuou nesta partida como massagista do trio de árbitros. A partida foi dirigida por Carlos Simon. Morreu o homem mas ficou sua fama de amigo leal, bom pai de família e acima de tudo um profissional de alta performance.
Natural de Porto Alegre, Lerman era viúvo de Amantina da Silva Lerman há sete anos. Tinha dois filhos -  Otilia e Miguel que também é massagista como o pai, bem como,quatro netos e dois bisnetos. O sepultamento de Abraão Lerman ocorreu  na quarta-feira no Cemitério Israelita, na rua Guilherme Schell 315, em Porto Alegre. – Jair Wingert – jornalista.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

O GAÚCHO DO HIPOGLÓS

Nas paragens de Morungava seguidamente aportava diversos tipos e muitos destes ajudaram a construir o folclore da cidade. Muitos destes araganos para não dizer teatinos fixaram residência no Morungava, casaram e constituíram família e hoje estão inteiramente adaptados aos usos e costumes. E num passado não muito distante do dia para noite apareceu no sitio do tio Dino um sujeito pêlo duro, cor de cuia, personagem típico vindo da fronteira que atendia pelo nome Eucares e estava em busca de emprego. Recém havia deixado o 6º Regimento de Cavalaria do Alegrete e ninguém ao certo sabe porque parou no Morungava. Sentado  no galpão  sorvendo um mate, tio Dino ouviu o jovem Eucares e se compadeceu do mesmo e contratou seus serviços, só que de pronto foi avisando o gaudério que a vida de tropeiro era coisa das brabas e que muitos não agüentavam o tirão. Nesta época tio Dino buscava gado em cima da serra, lá para as bandas da Vacaria, Bom Jesus e São Francisco. Tempos difíceis principalmente nos invernos onde no Rio Grande do Sul ao invés de habitantes existem sobreviventes. Noites dormindo no relento, tendo como abrigo galpões cedidos pelo caminho e o poncho velho como coberta. Não raro se dormia embaixo de figueiras centenárias, tendo o cruzeiro do sul e as três marias como teto. Não raro uma estrela cadente varava o céu e pedidos eram feitos. A gastronomia: comida campeira, arroz carreteiro com charque, feijão com couve e moranga, churrasco e café de chaleira com tição de brasa e as prosas intermináveis ao pé do fogo de chão nos acampamentos, que não raro giravam em torno de assombrações, boi tatá e tesouros enterrados pelos estancieiros nos períodos de revoluções e até da guerra dos farrapos assim eram as tropeadas e os tropeiros. Muitas  vezes as comitivas levavam uma semana na estrada para trazer o gado para o matadouro do Maroni que abastecia de carne Gravataí e os demais municípios que integram a grande Morungava.. Eucares velho de guerra aceitou o serviço em troca de uns pilas, alojamento e comida. Mesmo sem experiência na lida campeira, pois sempre foi guri da cidade, morava na Cidade Alta, mas estudou no bom e velho Lauro Dornelles. Na primeira tropeada lá perto de Vacaria desabou uma chuva de molhar a alma do vivente e o Eucares com o poncho "véio" todo molhado se deslocava numa troteada desgovernada tentado alcançar os demais integrantes da comitiva e no meio da ventania, Eucares caiu do cavalo e os tropeiro de longe viram a cena, o gaudério do Alegrete quase levantou vôo e ao longe  Eucares caindo e o poncho levantando parecia que ele havia saltado de pára-quedas. No acampamento a conversa foi sobre o Eucares o gaúcho de pára-quedas. Ao amanhecer os tropeiros liderados pelo Arcedino Nunes “tio Dino”, após lavar o rosto na cacimba e tomar café de cambona, com pão de queijo, salame e cuscuz começaram arrumar os apetrechos. O poncho era meticulosamente enrolado como um charuto e colocado na parte traseira do lombo do cavalo. O velho Eucares não conseguia enrolar o dito poncho e para não dar o braço a torcer e pedir ajuda, fez o que pode e ajeitou o poncho que com a cavalgada se abriu e vinha balançando para todo lado mais parecendo uma mala de garupa. A noite a conversa dos tropeiros girou em torno de Eucares “o gaúcho da mala de garupa”. Mais brabo que marimbondo em lixiguana estucado com taquara embebida em estopa com querosene, Eucares ficava num canto indignado com a gozação. No terceiro dia de cavalgada, tchê Eucares quase não podia caminhar, havia assado as virilhas de tal forma que estavam em carne viva. Calmamente tirou um tubo de hipoglós e se espreitou para dento de um capão como quem vai fazer as necessidade (passar um fax, largar um barro ou tirar a água do joelho, ou tudo junto). No meio do mato de camboim Eucares arriou a bombacha e não poupou na pomada. Ao retornar para o acampamento, pensando que ninguém o viraEucares sentou no meio da turma e não levou tempo para a gozação e aí tínhamos Eucares “o gaúcho do Hipoglos”. Este foi o batismo de sangue do índio velho do Alegrete que se transformou num grande tropeiro e permaneceu no Morungava por quase 10 anos até que retornou ao seu torrão natal. - Jair Wingert

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

O GUARDIÃO DO SINOS

O sol nasce lá para os lados de Quatro Colônias, o céu vermelho com alguns rabos de galo dão prenúncios que a chuva está próxima, ainda mais que nas duas noites anteriores havia um circulo branco em volta da lua. O dia começa amanhecer e sigo minha corrida matinal e desta feita faço uma inversão de percurso ao invés de usar como habitualmente a ciclovia, decido seguir pela Avenida dos Municípios. O ar gelado da manhã esconde o calor quase insuportável que teremos que enfrentar. Assim é o verão escaldante de Campo Bom.  Pelo acostamento da avenida sigo e por ser uma manhã de domingo o trafego é quase inexistente.  Ao me aproximar do trevo entre a Municípios e Presidente Vargas a opção é estender a corrida até ponte da Barrinha e dar uma olhada no velho Sinos.  Ao aproximar-me do rio, junto à ponte uma tombadeira carregada de saibro vem em direção ao centro da cidade, provavelmente vinda do Morro da Pedra. Em cima da ponte observo as águas turvas do velho rio dos ratões do banhado, ou o sinuoso Sinos que ainda guarda em suas margens e barrancas segredos e mistérios, lendas e histórias de pescadores.  Após alguns minutos contemplando as águas do nosso rio que sofre com a seca, pude verificar algumas linhas de espera colocadas estrategicamente nas margens, bem como, dois caicos acorrentados em árvores, rio acima, nas imediações do Recanto. Um martim pescador sentado em um galho de uma árvore que tombou dentro do rio está a espreita de seu alimento.  Ainda em cima da ponte na barranca do Sinos vi um homem, barba branca, sentado e de forma contemplativa aquele idoso trazia um olhar absorto que fitava a curva do rio. Desci ao lado da ponte e de forma mansa sentei-me ao lado daquele velho. Foi  uma lição de vida que jamais esquecerei. Na barranca do Sinos vi o velho soluçando, gota a gota sua  angústia o Sinos ia a levando. Quando um velho molha o rosto o seu  choro tem razão. Perguntei com apreensão; “O que te faz chorar assim?”. Sem tirar os olhos do rio ele me disse: “Meu irmão eu amei tanto, eu plantei nas barrancas deste rio muitas árvores, hoje é deserto em todo canto, não se vê nenhuma flor. Minha vida foi inútil, pois as dragas acabaram com o rio, sem contar os dejetos e esgotos jogados diretos no nosso rio. Ninguém faz nada, o rio está morrendo. Num passado não muito distante, os dourados batiam no espinhel e os grumatãs enchiam as redes, mas as cidades viraram as costas para o Sinos”, argumentou entristecido. Fui ficando emocionado com este velho soluçando, mesmo sem estar preparado eu lhe dei o meu conselho:” Não chore amigo, eu sei que tuas lágrima se misturam com o Sinos, mas a luta continua e em cada escola, em cada educador, em cada criança vai despertar o espírito de preservação e defesa da vida. As futuras gerações, nossos filhos e netos serão preservacionistas.  Vi os olhos daquele ancião brilharem e seu sorriso iluminou a barranca do rio e sem ao menos dizer-me adeus, ele embarcou em um caico postado ao seu lado e seguiu rio abaixo na direção de Novo Hamburgo, quem sabe rumo ao Poço do Carvão quem sabe na Volta da Égua. Nunca mais o vi neste meu gauderiar andejo como diria Jayme Caetano Braun. Mas de uma coisa tenho certeza: conversei naquela manhã com o guardião  do Sinos, ou simplesmente o velho do rio que sumiu na curva...

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

O DIA EM QUE O FUTEBOL VENCEU HITLER

A única foto que se conserva da heróica equipa do Dínamo e o nome dos seus jogadores e no estádio Zenit uma placa diz "Aos jogadores que morreram com a cabeça levantada ante o invasor nazista".
Todas as atrocidades cometidas pelos regimes ditatoriais como nazismo, fascismo e comunismo precisam ser lembradas para que nunca mais esqueçamos os malefícios feitos em nome de ideologias massacrantes que tiram do homem a liberdade. Hoje ainda restam alguns bastiões de regimes carcomidos e arcaicos que privam a liberdade, especialmente de jornalistas e blogueiros que divulgam  fatos e noticias que não agradam “o chefe”. Infelizmente ainda existem pessoas que tentam esquecer que houve um holocausto durante a segunda guerra mundial que ceifou de forma covarde mais de seis milhões de judeus. Que o mundo e em especial os mais jovens jamais esqueçam  o holocausto, nem os assassinatos cometidos por Stalin (URSS) e de tantos outros tiranos que se tivessem ao menos jogado futebol na infância não cometeriam tamanha bestialidade, sim, porque um atleta jamais faria algo deste tipo. O preconceito contra negros, judeus, ciganos, índios e outros povos sempre existiu e no futebol também, não faz muito que no Brasil alguns clube não permitiam que negros jogassem em suas equipes, por puro preconceito. E por ironia do destino, o maior de todos os tempos, o Rei Pelé é negro.  Justiça seja feita o Vasco da Gama, equipe do Rio de Janeiro foi à primeira equipe brasileira a colocar um negro em seu time e com isto sofreu a punição de exclusão da Liga por um ano, mas se manteve fiel e não abriu mão de seus princípios, até que finalmente aceitaram a inclusão de negros em sua agremiação, no Rio Grande do Sul o Internacional surge como clube do povo e por volta de 1927 os negros vindos da Liga da Canela Preta já vestiam a gloriosa camisa do alvi-rubro, equipe que anos mais tarde se tornaria a campeã de tudo, inclusive campeão do mundo Fifa. O Grêmio  Porto-alegrense  só em 1952 inclui o primeiro negro em seu time, justamente Tesourinha, ex- Inter e craque do Rolo Compressor. O Grêmio contratou Tesourinha que atuava no Vasco da Gama. O futebol é algo mágico capaz de mudar histórias, de parar guerras e unir pessoas. Só o futebol tem este poder de transcender. E uma das histórias mais bonitas do futebol aconteceu  justamente na Ucrânia, os jogadores do FC Start (nome clandestino do Dínamo de Kiev), hoje, são heróis da pátria e o seu exemplo de coragem é ensinado nos colégios. Os possuidores de entradas daquela fatídica partida têm direito a assento gratuito no estádio do Dínamo de Kiev.
Um padeiro alemão que trouxe esperança
A história do futebol mundial inclui milhares de episódios emocionantes e comoventes, mas seguramente nenhum seja tão terrível como o protagonizado pelos jogadores do Dínamo de Kiev nos anos 40. Os jogadores participaram de uma partida sabendo que se ganhassem seriam assassinados e, no entanto, decidiram ganhar. Na morte deram uma lição de coragem, de vida e honra que não encontra, pelo seu dramatismo, outro caso similar no mundo. Para compreender a sua decisão, é necessário conhecer como chegaram a disputar aquela decisiva partida, e porque um simples encontro de futebol apresentou para eles o momento crucial das suas vidas. Tudo começou em 19 de Setembro de 1941, quando a cidade de Kiev (capital Ucraniana) foi ocupada pelo exército nazista, e os homens de Hitler aplicaram um regime de castigo impiedoso e arrasaram tudo. A cidade converteu-se num inferno controlado pelos nazistas, e durante os meses seguintes chegaram centenas de prisioneiros de guerra, que não tinham permissão para trabalhar nem viver nas casas, assim todos vagavam pelas ruas na mais absoluta indigência. Entre aqueles soldados doentes e desnutridos, estava Nikolai Trusevich, que tinha sido guarda-redes do Dínamo. Josef Kordik, um padeiro alemão a quem os nazistas não perseguiam, precisamente pela sua origem, era torcedor fanático do Dínamo. Um dia caminhava pela rua quando, surpreso, olhou para um mendigo e de imediato se deu conta de que era o seu ídolo: o gigante Trusevich. Ainda que fosse ilegal, mediante artimanhas, o comerciante alemão enganou aos nazistas e contratou o guarda redes para que trabalhasse na sua padaria. A sua ânsia por ajudá-lo foi valorizado pelo jogador, que agradecia a possibilidade de se alimentar e dormir debaixo de um teto. Ao mesmo tempo, Kordik emocionava-se por ter feito amizade com a estrela da sua equipa.  Na convivência, as conversas sempre giravam em torno do futebol e do Dínamo, até que o padeiro teve uma idéia genial: encomendou a Trusevich que em lugar de trabalhar como ele, amassando pães, se dedicasse a buscar o resto dos seus colegas. Não só continuaria pagando-lhe, como juntos podiam salvar os outros jogadores. Percorreu o que restara da cidade devastada dia e noite, e entre feridos e mendigos foi descobrindo, um a um, os seus amigos do Dínamo. Kordik deu trabalho a todos, esforçando-se para que ninguém descobrisse a manobra. Trusevich encontrou também alguns rivais do campeonato russo, três jogadores da Lokomotiv e também os resgatou. Em poucas semanas, a padaria escondia entre os seus empregados uma equipe completa.
O time da paz e da esperança
Reunidos pelo padeiro, os jogadores não demoraram em dar o seguinte passo, e decidiram alentados pelo seu protetor, voltar a jogar. Era, além de escapar dos nazistas, a única coisa que bem sabiam fazer. Muitos tinham perdido as suas famílias nas mãos do exército de Hitler, e o futebol era a última sombra mantida das suas vidas anteriores. Como o Dínamo estava enclausurado e proibido, deram um novo nome para aquela equipa. Assim nasceu o FC Start, que através de contatos alemães começou a desafiar a equipes de soldados inimigos e seleções formadas no III Reich.  Em 7 de Junho de 1942, jogaram a sua primeira partida. Apesar de estarem famintos e cansados por terem trabalhado toda a noite, venceram por 7 a 2. O seu rival seguinte foi a equipe de uma guarnição húngara, ganharam de 6 a 2. Depois meteram 11 gols a uma equipe romena. A coisa ficou séria quando em 17 de Julho enfrentaram uma equipe do exército alemão e golearam por 6 a 2. Muitos nazistas começaram a ficar chateados pela crescente fama do grupo de empregados da padaria e buscaram uma equipa melhor para ganhar a eles. Trouxeram da Hungria o MSG com a missão de derrotá-los, mas o FC Start goleou mais uma vez por 5 a 1, e mais tarde, ganhou de 3 a 2 na revanche. Em 6 de Agosto, convencidos da sua superioridade, os alemães prepararam uma equipe com membros da Luftwaffe, o Flakelf, que era uma grande equipe, utilizado como instrumento de propaganda de Hitler. Os nazistas tinham resolvido buscar o melhor rival possível para acabar com o FC Start, que já gozava de enorme popularidade entre o sofrido povo refém. A surpresa foi grande, porque apesar da violência e falta de desportividade dos alemães, o Start venceu por 5 a 1.  Depois desta escandalosa queda da equipe de Hitler, os alemães descobriram a manobra do padeiro. Assim, de Berlim chegou uma ordem de acabar com todos eles, inclusive com o padeiro, mas os hierarcas nazistas locais não se contentaram com isso. Não queriam que a última imagem dos russos fosse uma vitória, porque acreditavam que se fossem simplesmente assassinados não fariam nada mais que perpetuar a derrota alemã. A superioridade da raça ariana, em particular no desporto, era uma obsessão para Hitler e os altos comandos. Por essa razão, antes de fuzilá-los, queriam derrotar a equipe num jogo.
A arte  da bola derrotou o nazismo
Com um clima tremendo de pressão e ameaças por todas as partes, anunciou-se a revanche para 9 de Agosto, no repleto estádio Zenit. Antes do jogo, um oficial da SS entrou no vestiário e disse em russo: -"Vou ser o juiz do jogo, respeitem as regras e saúdem com o braço levantado", exigindo que eles fizessem a saudação nazista. Já no campo, os jogadores do Start (camisa vermelha e calção branco) levantaram o braço, mas no momento da saudação, levaram a mão ao peito e no lugar de dizer: -"Heil Hitler !", gritaram - "Fizculthura !", uma expressão soviética que proclamava a cultura física. Os alemães (camisa branca e calção negro) marcaram o primeiro golo, mas o Start chegou ao intervalo do segundo tempo ganhando por 2 a 1. Receberam novas visitas ao vestiário, desta vez com armas e advertências claras e concretas: "Se vocês ganharem, não sai ninguém vivo". Ameaçou um  oficial da SS. Os jogadores ficaram com muito medo e até propuseram-se a não voltar para o segundo tempo. Mas pensaram nas suas famílias, nos crimes que foram cometidos, na gente sofrida que nas arquibancadas que gritavam desesperadamente por eles e decidiram, sim, jogar. Deram um verdadeiro baile nos nazistas. E no final da partida, quando ganhavam por 5 a 3, o atacante Klimenko ficou cara a cara com o arqueiro alemão. Deu-lhe um drible deixando o coitado estatelado no chão e ao ficar em frente à trave, quando todos esperavam o golo, deu meia volta e chutou a bola para o centro do campo. Foi um gesto de desprezo, de deboche, de superioridade total. O estádio veio abaixo. Como toda Kiev poderia a vir falar da façanha, os nazistas deixaram que saíssem do campo como se nada tivesse ocorrido. Inclusive o Start jogou dias depois e goleou o Rukh por 8 a 0. Mas o final já estava traçado: depois desta última partida, a Gestapo visitou a padaria. O primeiro a morrer torturado em frente a todos os outros foi Kordik, o padeiro. Os demais presos foram enviados para os campos de concentração de Siretz. Ali mataram brutalmente a Kuzmenko, Klimenko e o Trusevich, que morreu vestido com a camiseta do FC Start. Goncharenko e Sviridovsky, que não estavam na padaria naquele dia, foram os únicos que sobreviveram, escondidos, até a libertação de Kiev em Novembro de 1943. O resto da equipe foi torturado até a morte. Ainda hoje, os possuidores de entradas daquela partida têm direito a um assento gratuito no estádio do Dínamo de Kiev. Nas escadarias do clube, custodiado em forma permanente, conserva-se atualmente um monumento que saúda e recorda aqueles heróis do FC Start, os indomáveis prisioneiros de guerra do Exército Vermelho aos quais ninguém pôde derrotar durante uma dezena de históricas partidas, entre 1941 e 1942.  Foram todos mortos entre torturas e fuzilamentos, mas há uma lembrança, uma fotografia que, para os torcedores do Dínamo, vale mais que todas as jóias em conjunto do Kremlin. Ali figuram os nomes dos jogadores.  A única foto que se conserva da heróica equipa do Dínamo e o nome dos seus jogadores. Texto e Pesquisa: Jair Wingert; jornalista.
Goncharenko e Sviridovsky, os únicos sobreviventes, junto ao monumento que recorda os seus colegas.