quinta-feira, 7 de abril de 2011

O CACHORRO QUE CALCULAVA

A repercussão dos artigos sobre Morungava vem causando forte impressão entre os assíduos leitores de nossos artigos, abordando sobre uma dos locais mais lindos e bucólicos do pampa gaúcho.  E sem dúvidas o meu tio Dino é o meu personagem preferido pelas histórias das quais foi protagonista, aliás, tio Dino era um exímio contador de história.   Peri o cachorro do tio Dino era um perdigueiro que só faltava falar, obediente, manso como um cordeiro ao ponto das crianças menores montarem nele feito um mini-ponei. Mas Peri também era do tipo valente, nas caçadas que tio Dino empreendia, Peri era quem entrava nos banhados em busca das perdizes alvejadas. Aqui faço um parêntese esta prática de tio Dino na minha avaliação era deplorável e até hoje não sei como nenhum deputado estadual criou uma lei aqui no Rio Grande do Sul proibindo esta prática maldita.  Outra habilidade de Peri era juntar um boi marrento pelo focinho no campo e fazer o bicho velho deitar. A relação de meu tio como os animais, cães e gatos sempre foi muito forte, mas um dia tio Dino  ganhou de presente um filhote de “ guaípeca” ou SRD – Sem Raça Definida; vira-lata, de um grupo de ciganos que andavam feito araganos vendendo panelas e cobertores por aquelas paragens. O cachorrinho cresceu, ficou viçoso, mas acabou desenvolvendo um hábito terrível, passou a comer ovos. As galinhas poedeiras cantavam anunciando o feito e lá corria Lobo para se deliciar com o manjar galináceo. Tunda de relho, preso na corrente por vários dias, nada tirava do cão o maldito vício de comer ovos. Até que um dia no bar do seu Otacílio um viajante (nome dado em Morungava aos vendedores de atacado) deu uma receita infalível na qual você fervia um ovo e depois abria a boca do cão e colocava o ovo  tinindo dentro da boca do pobre  animal, passando  uma corda pelo focinho. Depois da língua queimada, nunca mais o bicho queria saber de ovo.  Meses depois tio Dino estava no armazém e o “viajante” chegou e perguntou: “Fez o negócio do ovo quente na boca do cachorro”. Ao que meu velho tio respondeu “Fiz sim” E o  vendedor questionou: “ E deu certo?”. Tio Dino coçando o queixo respondeu sem hesitar: “No começo deu certo, só que agora antes de comer o ovo, o Lobo assopra o mesmo durante uns quinze minutos”.  Mas voltando ao nosso personagem de hoje, Peri além de todas as virtudes citadas acima, cumpria religiosamente um ritual, duas vezes por semana ele seguia por quatro quilômetros de estradas vicinais até o centro do Morungava, com um balaio no pescoço e uma toalha bordada, além de um bilhete e dinheiro dentro do balaio. No bilhete tio Dino pedia ao açougueiro de nome Maroni a quantidade e o tipo de carne desejava.  Peri saia de casa por volta das 9 horas da manhã e retornava sempre até as 11 horas. Um dia tio Dino ficou preocupado, pois já havia passado do meio dia e nada do Peri. Quem sabe uma cadela no cio atraiu a atenção do velho mascote, ou teria sido atropelado pelos caminhões que puxavam saibro? Preocupado após o almoço, tio Dino montou seu zaino e seguiu pela estrada observando pelos campos a presença do fiel e bom Peri, mas nada do cão. Chegando à cidade, mais precisamente no açougue, meu tio avistou a cena inusitada, lá contra a parede, de pé estava o Peri rangendo ou rilhando os dentes, mais bravo que marimbondo, espreitando o açougueiro, tudo porque o mesmo não havia colocado dentro do balaio o troco certo.  E como diz o filósofo da Bela Vista ou “Vila dos Tocos”, Omar Freitas às vezes a gente na vida tem que comer pelas beiras, como cachorro come pirão quente.